De há muito tempo, a jurisprudência dos Tribunais do país debate sobre a essencialidade de maquinários agrícolas (trator, colheitadeira, pulverizador, etc) para o regular desenvolvimento das atividades rurais do produtor rural, bem como sobre o direito de manutenção de posse enquanto pendente de julgamento ação de alongamento/prorrogação de cédulas rurais, com base no Manual de Crédito Rural (MCR) do Banco Central do Brasil.
De um lado, os bancos e as cooperativas, uma vez vencida a cédula de investimento, lançam mão de medidas coercitivas, sendo a busca e apreensão a principal delas, já que estribadas em garantia de alienação fiduciária.
Medida drástica, a busca e apreensão impõe severos prejuízos ao lavoureiro, seja durante o plantio, seja no transcorrer da colheita.
Por outro lado, diante do cenário preocupante e desafiador do agronegócio nacional, com altíssimo nível de inadimplência, os produtores se socorrem da ação de alongamento das operações de natureza rural, a fim de que tais operações sejam redimensionadas à luz da real capacidade de pagamento do produtor, com base em argumentação jurídica sólida e em laudo agronômico consistente.
Mas afinal, enquanto pendente a ação de prorrogação, o banco ou a cooperativa podem retomar os maquinários alienados fiduciariamente, por meio da ação de busca e apreensão?
Afirmamos que NÃO!
Ora, se o ciclo produtivo do lavoureiro foi comprometido por intempéries climáticas (como seca, geada e enxurradas) ou problemas no preço das comodities agrícolas, penso ser plenamente possível que o produtor permaneça na posse dos seus maquinários, até a redefinição, por sentença judicial, do direito ao alongamento e dos seus contornos.
Mesmo porque, toda a legislação agrícola, que nasceu na década de 60, contempla várias medidas de apoio e de fortalecimento econômico do produtor rural, como por exemplo o Decreto-Lei 167/67 e a Lei 4.829/65, essa última que instituiu a política agrícola no país.
Portanto, enquanto não revisados judicialmente as cédulas de custeio ou investimento, o banco ou a cooperativa não podem retomar os maquinários por meio de busca e apreensão.
Vale lembrar que as leis agrícolas são de índole SOCIAL, e as matérias nelas estabelecidas são de ORDEM PÚBLICA, pois garantem, em última análise, o abastecimento regular de alimento no âmbito do mercado consumidor.
Essa minha conclusão acerca da necessidade de que o produtor permaneça na posse dos seus maquinários na pendência de processos judiciais, encontra amplo respaldo na jurisprudência do Estado de Mato Grosso do Sul.
Ao julgar o Agravo de Instrumento – Nº 1411270-55.2025.8.12.0000 – Chapadão do Sul, a Segunda Câmara Cível da nossa Corte Estadual decidiu que “a existência de alienação fiduciária sobre o bem financiado (colheitadeira) e iminente ajuizamento de
busca e apreensão justificam o periculum in mora, diante do risco de paralisação da
atividade rural”.
Já ao julgar o Agravo de Instrumento – Nº 1409612-93.2025.8.12.0000 – Naviraí, a Primeira Câmara Cível da mesma Corte de Justiça decidiu que “tratando-se de implemento e maquinários agrícolas, tem-se como bens
indispensáveis ao desenvolvimento da atividade da parte devedora (produtor rural),
justificando-se, excepcionalmente, a permanência na posse dos bens com o devedor na
qualidade de depositário”.
Ademais, entrou em vigor a recentíssima MEDIDA PROVISÓRIA 1314, de 5 de setembro de 2025, estabelecendo expressamente em seu texto a possibilidade de prorrogação/alongamento de cédulas de INVESTIMENTO, tais como as destinadas ao financiamento de tratores, colheitadeiras, pulverizadores e outros maquinários indispensáveis ao desenvolvimento das atividades rurais.
Logo, por todas essas razões, concluo ser direito do produtor rural manter-se na posse dos seus maquinários enquanto pendente de apreciação pelo Poder Judiciário a pretensão de alongamento e revisão das cédulas e operações de natureza rural.
Trata-se, repito, de conclusão que se afina com a função social da propriedade rural e com a diretriz nuclear da política agrícola do país, que se atenta para o FORTALECIMENTO ECONÔMICO dos nossos produtores rurais.
É o que penso!

